No início do ano de 2022 entrou em vigor o art. 1º da Lei nº 13.818/2019, que alterou o artigo 289 da Lei nº 6.404/76 (“LSA”), relativo às formas de publicação das sociedades por ações. A alteração se soma às modificações na LSA promovidas em 2021 pelo Marco Legal das Startups (Lei Complementar nº 182/21), resultando num regramento mais flexível e menos oneroso para as publicações obrigatórias das companhias brasileiras.
De mais importante, a Lei nº 13.818/19 desobrigou as sociedades de publicarem seus atos no Diário Oficial, passando a exigir apenas a publicação (i) em jornal impresso de grande circulação, de forma resumida; e (ii) no site do mesmo jornal, na íntegra. Essa passou a ser a nova regra geral para as companhias, sejam abertas ou fechadas, com algumas exceções em função do porte da sociedade, abordadas adiante.
Assim, a partir do início deste ano, demonstrações financeiras, editais e atas de assembleias e quaisquer outros atos de publicação obrigatória, previstos na LSA, não precisam mais ser publicados no D.O. Isso já vale, portanto, para a temporada de balanços e assembleias que se avizinha.
A mudança, porém, não vem sem resistência. Em outubro de 2021, ainda antes da entrada em vigor do art. 1º da Lei nº 13.818/19, a Associação Brasileira de Imprensas Oficiais ajuizou uma ação (ADIN 7011) perante o Supremo Tribunal Federal questionando a sua constitucionalidade, inclusive com pedido liminar para suspender a eficácia da norma até o julgamento definitivo da lide e assim restaurar a obrigatoriedade das publicações no Diário Oficial, sob o argumento de afronta aos princípios de publicidade e isonomia. Até o momento, o pedido ainda não foi apreciado pela Min. Carmen Lúcia, relatora da ação, sendo necessário acompanhar o desenrolar do caso.
Como mencionado, além de dispensar a publicação no Diário Oficial, o novo art. 289 da LSA, também com o intuito de reduzir custos, passou a permitir a publicação impressa de forma resumida, em jornal de grande circulação, acompanhado da divulgação integral no site do mesmo veículo.
No caso das demonstrações financeiras, a lei estabeleceu alguns parâmetros gerais para tal publicação resumida, como valores globais e classificações das contas, bem como extratos de informações relevantes constantes de notas explicativas e pareceres do auditor independente e do conselho fiscal. Para as companhias abertas, a Comissão de Valores Mobiliários publicou o Parecer de Orientação 39, com orientações mais detalhadas sobre o conteúdo mínimo das DFs resumidas.
No que tange aos demais atos, contudo, como atas de assembleia geral, não há contornos legais ou regulatórios para determinar o nível de sintetização aceitável. A prática tende a se encarregar de estabelecer certos padrões razoáveis, cabendo a cada companhia avaliar com cautela os critérios que adotará daqui em diante, inclusive os casos em que a publicação resumida pode eventualmente não se justificar.
Por sua vez, os artigos 294, 294-A e 294-B, com a redação que lhes foi dada pela Lei Complementar 182, estabelecem regimes especiais para companhias fechadas e abertas em função do valor de suas receitas, como exceções à nova regra geral de publicação do art. 289 da LSA.
Conforme o art. 294, as companhias fechadas que tiverem receita bruta anual de até R$ 78 milhões – valor este por entidade e não por grupo econômico – estão isentas de realizar suas publicações em jornal impresso, bastando sua divulgação de forma eletrônica. A Portaria nº 12.071/21, do Ministério da Economia, estabeleceu que essa divulgação deve ser feita tanto no site da própria empresa como na Central de Balanços do SPED (Sistema Público de Escrituração Digital). O valor do patrimônio líquido e a quantidade de acionistas da companhia, antes previstos no artigo alterado, deixaram de ser critérios para a dispensa de publicação.
Já o artigo 294-A conferiu à CVM a possibilidade de dispensar ou modular determinadas obrigações para companhias abertas de “menor porte”, assim definidas, no art. 294-B, como aquelas com receita bruta anual inferior a R$ 500 milhões. Dentre os pontos que foram delegados à futura regulamentação da CVM está a forma de realização das publicações obrigatórias (art. 294-A, IV). Até o momento, porém, a CVM ainda não expediu norma sobre o tema.
Por fim, no último dia 20 de janeiro, foi editada a Instrução Normativa DREI 112, alterando a IN DREI 81 e seus anexos em diversos aspectos, para adequá-los à nova legislação empresarial, incluindo no tocante às novas regras de publicação introduzidas pela Lei nº 13.818/19 e LC 182/21. Importante destacar que o DREI, acertadamente, estabeleceu que “não compete à Junta Comercial analisar o mérito das publicações que devem ser realizadas de forma resumida no jornal impresso, salvo no caso do resumo de demonstrações financeiras, que deve conter o mínimo contido no inciso II do art. 289 Lei nº 6.404, de 1976.”
Outro ponto a notar é que tanto a divulgação eletrônica no SPED, para as companhias fechadas com até R$ 78 milhões de receita bruta, quanto no site do jornal impresso, para as demais sociedades anônimas, devem contar com certificação digital.
Em resumo, como resultado das Leis nº 13.818/19 e LC nº 182/21, podemos sintetizar assim as modificações às regras legais sobre as publicações obrigatórias das sociedades anônimas (sem prejuízo de obrigações adicionais impostas por reguladores como CVM, Bacen, Susep etc, conforme aplicáveis):
Regra Anterior | Novas Regras | ||
Publicação Impressa | Publicação Impressa | Divulgação Eletrônica | |
Companhias fechadas em geral (art. 289) | jornal de grande circulação e D.O. | apenas jornal de grande circulação, de forma resumida | no site do mesmo jornal, na íntegra |
Companhias fechadas de menor porte (art. 294) | companhias fechadas com patrimônio líquido até R$ 10 milhões e menos de 20 acionistas estavam isentos de publicar editais e DFs. | companhias fechadas com receita bruta anual de até R$ 78 milhões não precisam mais realizar publicações impressas | no SPED e no site da companhia. |
Companhias abertas em geral (art. 289) | jornal de grande circulação e D.O. | apenas jornal de grande circulação, de forma resumida | no site do mesmo jornal, na íntegra |
Companhias abertas de menor porte (arts. 294-A e 294-B) | jornal de grande circulação e D.O. (não havia o conceito de companhia aberta de menor porte) | companhias abertas com receita bruta anual de até R$ 500 milhões estão sujeitas às mesmas regras aplicáveis às companhias abertas em geral, até que seja expedida pela CVM norma flexibilizando esse regime. |
Cumpre ressaltar, por fim, que não foram alteradas as disposições do Código Civil sobre publicações de sociedades simples e limitadas – nos poucos casos em que elas são exigidas, como, por exemplo, reduções de capital, fusões e incorporações – o que, em princípio, faz com que essas sociedades continuem obrigadas a utilizar o Diário Oficial nessas hipóteses, criando um evidente desequilíbrio legislativo. Microempresas e empresas de pequeno porte, por outro lado, por força da Lei Complementar 123/06, continuam dispensadas da publicação de qualquer ato societário.
Embora se possa lamentar pelo que deixaram de avançar, as alterações à LSA aqui comentadas representam um alívio importante e longamente aguardado para a diminuição dos custos e burocracias das companhias brasileiras, sem acarretar prejuízo à necessária publicidade dos atos.
Fonte: SITE BMA ADVOGADOS